domingo, 9 de setembro de 2012

BREVES REFLEXÕES SOBRE A DEMOCRACIA QUE TEMOS E A DEMOCRACIA QUE QUEREMOS
  •  Oito características pelo menos definem a ordem democrática que impera no nosso país:

  • - é de baixa intensidade. Limita-se a consagrar os mecanismos de representatividade não oferecendo condições à participação dos cidadãos nas decisões e opções dos representantes.
    - serve um poder hegemónico e estatizado. Os representantes aparecem divididos entre os que pertence e os que não pertencem ao chamado “arco da governação”, circunscrevendo a sua acção à manipulação ou tentativa de manipulação das alavancas do Estado, sem nenhuma interacção com os que os elegeram. - é estática e conservadora. Fixa como limites à contestação a inquestionabilidade do seu modelo de funcionamento: o direito é abordado à luz dos deveres que implica; o sistema vigente é assumido como uma ordem incontornável e só mutável a partir de si próprio.
    - é cada vez menos soberana. Progressivamente vem delegando os poderes que representa e as prorrogativas que possui nos detentores/dominadores da ordem económica e política europeia e mundial.
    - é clientelista. A cor politica prevalece sobre a competência na selecção dos decisores colocados em lugares chave do Estado e/ou do sector empresarial influenciado pelo Estado (e recorda-se a título de exemplo, porque recente, a designação do presidente do conselho de administração da RTP conhecido pela sua bajulação ao 1º ministro).
    - é promiscua na sua relação com a economia. Assiste-se a uma verdadeira “dança de cadeiras” entre decisores políticos e gestores empresariais.
    - é classicista. Por iniciativa da maioria tem-se assistido a um progressivo e continuado atentado aos direitos dos trabalhadores, à protecção dos interesses dos socialmente privilegiados e ao alargar do fosso entre pobres e ricos.
    - é monolítica. As regras de funcionamento e evolução do país são impostas pela maioria, sempre a mesma, apoiada na disciplina de voto, na obstrução à audição de governantes pelo Parlamento, no dictat quanto à definição da agenda politica. Como é evidente há diversidade na democracia representativa. Muitos dos representantes eleitos são opositores da tendência para que caminha a democracia hegemónica. O sistema está, no entanto, montado de modo a que não passem de simples vozes que não impedem a afirmação das características dominantes.
     2. A alteração desta matriz democrática é no entanto possível, passando pelo reforço e afirmação da democracia participativa que a Constituição Portuguesa reconhece como um dos dois pilares da democracia plena mas que a prática dominante esvaziou.
    Neste sentido impõe-se pugnar por algumas medidas. Sugerem-se, nomeadamente oito que se elencam de seguida, sem a preocupação de as hierarquizar por grau de importância. A saber:
    - Induzir os partidos que enformam a democracia representativa a dedicar uma parte do seu tempo ao diálogo (um diálogo instituído) com forças emergentes da democracia participativa, não como uma concessão de quem recebe mas como um direito de quem é recebido. (Do mesmo modo que algumas autarquias reservam um ou mais dias da semana a receber e ouvir os munícipes, os representes dos partidos abririam um tempo na sua agenda para atender os cidadãos colectivos que agem na sociedade).
    - Assegurar o financiamento da democracia participativa, pela afectação de verbas às suas formas organizadas, à semelhança do que acontece já em alguns países do norte da Europa. A desigualdade de oportunidades entre a democracia representativa e a democracia participativa está, de facto, bem patente na circunstância de à primeira serem facultadas todas as condições para o seu funcionamento material (vencimentos de representantes e assessores, orçamentação dos parlamento, pagamentos das campanhas eleitorais e de despesas de representação, etc…) ao mesmo tempo que são negadas as condições mínimas de subsistência das formas organizadas da democracia participativa… tratadas, por via de regra e na melhor das hipóteses, como prestadoras de serviços ao Estado e à própria democracia representativa.
    - Dar-se corpo a um movimento pró democracia participativa que se afirme interagindo com as várias iniciativas cidadãs esboçadas a nível local, regional e nacional em defesa dos bens públicos, dos direitos sociais e dos desenvolvimento alternativo e tendo presente que está em causa uma crise que é civilizacional e mundial embora se exprima, a mais das vezes, de forma circunscrita.
    - Encorajar a desobediência e a indignação. A democracia hegemónica sustenta-se na aceitação ordeira das suas práticas e manifestações, legitimando-se pela sacralização do seu próprio funcionamento. Superar esta ordem implica necessariamente uma prática transgressora.
    - Desmontar os discursos dominantes. A democracia hegemónica reproduz-se e valida-se a partir de uma argumentação que naturaliza as suas opções, apoiando-se para o efeito na influência dos média que, de uma forma geral, alimentam esses discursos dando a voz, privilegiadamente, a quem os profere. Não é possível gerar contra corrente sem contrapor ao conhecimento hegemónico explícito um conhecimento alternativo, hoje ainda marginal.
    - Animar e privilegiar os processos participativos nos mais diversos domínios (economia, cultura, educação, saúde, etc..) e âmbitos. A democracia plena constrói-se de baixo para cima e do pequeno para o grande, dando centralidade ao periférico e apostando-se no alterativo (no criação de um outro eu) mais ainda do que no próprio alternativo.
    - Promover uma cultura da escuta, com o que se quer significar não apenas desocultar o que está oculto, ouvir o que está silenciado ou silencioso mas também interagir com quem se escuta e/ou se não ouve.
    3 -   A democracia representativa é um imperativo, mas sem se reconfigurar, sem uma nova relação com os cidadãos, sem o impulso da democracia participativa tende a tornar-se, inevitavelmente, uma alienação. Assim o mostra o que está a acontecer no nosso país. Só com a democracia participativa, a democracia representativa cumprirá o mandato do pensamento republicano: liberdade igualdade e fraternidade.
    Rui d'Espiney

    3 comentários:

    1. Estando de acordo que a nossa democracia ,que se instalou no dia seguinte ao 25 de Abril, e se agravou com a dupla ,dos nossos Cavaco X Soares, há cerca de 20 anos, se caracteriza por:

      --- ser de baixa intensidade
      --- servir um poder hegemónico
      --- ser cada vez menos soberana.
      --- ser clientelista.
      --- ser promiscua
      --- ser classicista
      --- e, ser monolítica

      José Brito

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    2. José Brito acrescenta :
      opino que
      ...A alteração desta matriz democrática será apenas possível, quando as eleições para a Assembleia da Republica passarem a ter cariz nominal dominante , pela introdução de alterações ao método de Hont na sua pureza inicial
      .A maioria dos países com estabilidade e eficiência democrática e com robustez económica , usam Hont modificado nas eleições . em regimes parlamentaristas ou presidencialistas , na generalidade.
      De contrario , o corporativsmo ou fisiologismo partidário adulterará o direito e conceitos à CIDADANIA em aperfeiçoamento continuado

      Creio ser mais uma UTOPIA,acreditar que

      ---Induzir os partidos que deformam a democracia representativa a dedicarem uma parte do seu tempo ao diálogo
      ---Assegurar o financiamento da democracia participativa,
      ---Dar-se corpo a um movimento pró democracia participativa
      ---Encorajar a desobediência e a indignação
      --- Desmontar os discursos dominantes
      --- Animar e privilegiar os processos participativos
      ---Promover uma cultura da escuta,

      porque tudo ficará na mesma, ao serem eleitos "seres" nomeados pelos altos cleros dos partidos , desconhecendo os eleitores os predicados humanistas e éticos dos candidatos à procura ou que aceitam tachos ...e é pena que isto não esteja a ser esclarecido com clareza e honestidade .As acções acima descritas são absolutamente necessárias , mas sem as tais eleições com algum cariz regional e nominal... tudo fica como antes no quartel de Abrantes

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    3. A tradução do Google do texto de Rui d'Espiney para inglês automaticamente detectado galego, não Português. O que me lembra da história sobre o galego marxista-leninista, que morreu de rir (eles fizeram uma autópsia, mas não conseguiu encontrar a piada).

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